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CÂNCER DE RETO

INTRODUÇÃO

O câncer colorretal é a terceira neoplasia maligna mais freqüente no mundo e a segunda maior causa de morte por câncer nos Estados Unidos, desconsiderando-se o sexo. Segundo relatório do Instituto Nacional do Câncer (RJ), para o ano de 2.000, estima-se que no Brasil ocorreram por volta de 13.400 novos casos de câncer colorretal e que por volta de 6.700 brasileiros teriam morrido da doença até o final do ano passado. Acrescente-se ainda que a mortalidade global ao final de cinco anos associada ao câncer do intestino grosso —e aqui inclui-se o câncer no reto (CR)— permaneceu nas últimas décadas quase que inalterada e ao redor de 50%.

Anatomia

O reto é a porção final do intestino grosso na forma de um tubo muscular, mede entre 12 e 15 cm de extensão e embora seja ainda persistam controvérsias sobre as definições de seus limites cranial e distal, podemos defini-lo de acordo com a observação anatômica e a cirúrgica. Os limites anatômicos do reto são a projeção da terceira vértebra sacral cranialmente e a linha pectínea ou dentada (transição anorretal) caudalmente. O limite cirúrgico proximal do reto corresponde ao promontório sacral e o limite cirúrgico distal é definido pelo anel anorretal (limite superior do assoalho pélvico / músculos elevadores do ânus.

O cólon, incluindo o reto, é o sítio mais freqüente de neoplasias primárias do que qualquer outro órgão do corpo humano. É sede de neoplasias de origem benigna, os adenomas, e de origem maligna, os carcinomas. Os adenocarcinomas representam a quase totalidade dos cânceres colorretais. Há múltiplos fatores envolvidos na etiologia do câncer colorretal na medida em que múltiplos passos estão implicados na sua patogênese. É provável que ambos fatores exógenos como hereditários interajam no aparecimento do câncer do cólon e do reto variando a sua importância, no entanto, de acordo com cada caso.
Uma vez que o câncer colorretal representa uma neoplasia onde as lesões pré-malignas (pólipos adenomatosos e as lesões planas não-polipóides) são conhecidas, evolui de forma relativamente lenta e a maioria dos tumores apresenta a mesma histologia (de forma que apenas esporadicamente o pior prognóstico é resultado de características morfológicas distintas).

O CR, assim como o câncer no cólon representa uma doença dos países ocidentais e industrializados onde o consumo de carnes, gorduras e carboidratos é alto.  Apresenta maior incidência nos Estados Unidos e Canadá, na Grã-Bretanha, nos países escandinavos, Dinamarca, na Austrália e na Nova Zelândia.

Dentre os fatores ambientais e dietéticos conhecidos envolvidos na etiologia do câncer colorretal, destacam-se:

· dieta: ainda que a dieta ocidental esteja associada a risco aumentado de câncer colorretal, os fatores responsáveis carecem de definição mais precisa.  No entanto, a ingesta de fibras insolúveis parece representar fator de proteção contra o câncer por força da redução da concentração fecal de ácidos biliares, maior velocidade do trânsito intestinal e maior produção de metabólitos intraluminais anti-proliferativos como ácidos graxos de cadeia curta (butirato). A ingesta de gorduras em quantidade superior a 20% da dieta e especialmente as saturadas estão associadas a maior risco de câncer resultante ou não da ação aumentada de ácidos biliares sobre a mucosa intestinal. Experimentalmente, ácidos biliares secundários (resultantes da ação de bactérias na luz intestinal) são promotores de tumores colônicos. A concentração fecal desses ácidos está significativamente aumentada em indivíduos que recebem dietas ricas em gorduras. Pacientes com câncer colorretal exibem concentrações fecais de ácidos biliares mais elevadas que os indivíduos-controle. Alguns estudos sugerem que o cálcio tenha efeito protetor. Essa ação pode ser resultado de maior fixação intraluminal de sais biliares e ácidos graxos ou da simples inibição da resposta proliferativa do epitélio colônico frente a gorduras e ácidos biliares. O selênio, micronutriente essencial que funciona como cofator da glutationa peroxidase (protege as células do dano oxidativo) parece estar associado a proteção contra o câncer colorretal conforme demonstrado a partir de estudos experimentais — um resumo dos principais fatores dietéticos relacionados ao aparecimento do câncer colorretal bem como seu possível mecanismo de ação encontra-se exposto a seguir:

FATOR DIETÉTICO                                                 
MECANISMO DE AÇÂO

– GORDURA
Carcinógena. Favorece maior concentração fecal de ácidos biliares (reconhecidos carcinógenos experimentais) que levam a maior proliferação celular epitelial

– FIBRAS INSOLÚVEIS
Protetoras. Mecanismo de ação possivelmente relacionado a diminuição da concentração fecal de ácidos biliares, aumento do trânsito intestinal e maior concentração de microflora anaeróbia que leva a maior produção de metabólitos protetores (ácidos graxos de cadeia curta)

– CÁLCIO
Protetor. Resulta em maior fixação luminal de ácidos biliares e ácidos graxos diminuindo sua ação irritativa sobre a mucosa e redução direta da proliferação celular em resposta a carcinógenos

– SELÊNIO
Protetor. Redução direta do dano oxidativo por ação como cofator da glutationa peroxidase

· Tabagismo: até recentemente havia evidência insuficiente para a relação entre fumo e câncer colorretal. No entanto, o maior aparecimento de carcinomas após um período de exposição ao fumo de no mínimo 35 anos foi recentemente demonstrado.

· Fatores ocupacionais: inalação de pó, exposição a fumaça e ocupação industrial podem elevar o risco de câncer colorretal.

· Radioterapia: a irradiação da pelve está associada a maior risco de câncer do reto.

· Doença inflamatória intestinal: pacientes com retocolite ulcerativa têm risco aumentado de desenvolver câncer colorretal em especial quando a doença foi diagnosticada em idade jovem ou quando a forma é a de pancolite. Nesses casos, o risco de degeneração é de aproximadamente 0,5% por ano após uma década do diagnóstico da doença como resultado da ocorrência de displasia de baixo grau (risco de câncer associado de 10%), alto grau (risco entre 30 e 40%) ou associada a lesão ou massa (superior a 50%). Em contrapartida, vale lembrar que quando o câncer aparece, a displasia pode estar ausente em até 25% dos casos o que põe em xeque o real papel da colonoscopia com biópsias seriadas nos pacientes com câncer colorretal. Há evidências de que a terapia farmacológica com sulfasalazina esteja associada a menor risco de degeneração. O risco de degeneração maligna entre os doentes com doença de Crohn é até o momento incerto e a atenção do cirurgião deve estar dirigida para os doentes cujo diagnóstico se deu em idade jovem mas sobretudo frente à presença de estenoses.

· Pólipos adenomatosos: é geralmente aceito que a maioria dos casos de câncer no cólon e no reto se origina a partir de pólipos adenomatosos pré-existentes. Dentre as evidências indiretas, clínicas e epidemiológicas a respeito dessa associação, ressaltamos: a prevalência de carcinomas do intestino grosso segue a distribuição geográfica dos adenomas, há concordância entre as lesões conforme os grupos étnicos observados, os cânceres ocorrem em faixa etária média superior em aproximadamente cinco anos à de ocorrência dos adenomas, cerca de um terços das peças de ressecção por câncer colo-retal incluem um ou mais pólipos adenomatosos (frequência cerca de seis vezes superior à observada em grupos-controle sem câncer), focos residuais de adenoma são, não raramente, encontrados em espécimes de câncer colorretal, o aumento do grau de atipia nos adenomas é proporcional ao seu crescimento e há coincidência na distribuição topográfica entre adenomas e o câncer colorretal. A mais forte evidência indireta de que pólipos adenomatosos originam câncer foi originada pelo National Polyp Study conduzido nos estados Unidos. Nesse estudo, o seguimento de seis anos de pacientes submetidos colonoscopia e polipectomia onde todos os pólipos encontrados foram removidos indica que, em relação a três grupos-controle ajustados para a idade, a incidência de CCR foi reduzida entre 76 e 90% em relação às populações de referência. No que se refere ao potencial maligno de pólipos adenomatosos, o risco de câncer aumenta para um adenoma progressivamente com o seu tamanho e quando sua histologia é do tipo vilosa em oposição ao tipo tubular. Para os pacientes com polipose adenomatosa familiar (PAF), doença genética de herança autossômica dominante, caracterizada pela presença de centenas a milhares de pólipos adenomatososa colônicos, o risco de aparecimento do câncer colorretal é de virtualmente 100% e geralmente na terceira ou quarta décadas de vida caso o paciente recuse a colectomia.

· Câncer de novo: ainda que a prevalência e portanto sua importância no universo de doentes com câncer colorretal ainda esteja por ser determinada, restam poucas dúvidas de que cânceres de novo se originam a partir da mucosa colorretal sem lesão adenomatosa pregressa ou associada. O achado de um caso de câncer precoce na forma de lesão plana deprimida foi inicialmente descrito por Kariya em 1977 e têm sido reportado principalmente por endoscopistas e patologistas japoneses nos últimos anos. É do entendimento desses pesquisadores que os cânceres precoces identificados em lesões planas deprimidas representam a via da carcinogênese de novo.
Apesar de a maioria dos cânceres retais (os localizados no reto médio e inferior) serem facilmente diagnosticáveis pelo toque digital do reto, a maioria desses cânceres não produz sintomas antes de se tornarem moderadamente avançados. Uma certa fração desses tumores poderá ser diagnosticada durante exames físicos de rotina (vale lembrar que o exame digital do reto faz parte do exame físico completo) ou mesmo durante a avaliação da próstata conforme realizada pelo urologista.

O sangramento representa o sinal mais comum do CR e é como se poderia imaginar freqüentmente atribuído a doença hemorroidária a qual, devido à sua relativa alta prevalência, representa uma condição associada comum. O sangramento geralmente ocorre em pequena quantidade e associado a fezes relativamente bem formadas. A eliminação de muco também é um sinal comum e a anemia não representa condição essencial ao diagnóstico. O aumento do número de evacuações e a sensação de evacuação incompleta bem como a urgência são sintomas-chave para o diagnóstico, embora ocorram para os tumores que ocupam um certo volume na luz retal, e, dessa forma, mais avançados. A dor e a obstrução são eventos raros. A confirmação da suspeita

Papel da colonoscopia

Em pacientes com CR detectado à retoscopia, até 7% albergam tumor sincrônico ( outro tumor no mesmo período) mais proximal e fora do alcance do retossigmoidoscópio rígido. Em pacientes com idade inferior a 50 anos e com câncer colorretal, 15% possuem tumor sincrônico. Adenomas sincrônicos são observados em até 30% dos pacientes com câncer do intestino grosso. A maioria dessas lesões é encontrada em segmentos que normalmente não seriam incluídos na ressecção convencional do CR. Conseqüentemente, recomenda-se que todos os pacientes com diagnóstico de CR sejam submetidos a colonoscopia total ainda no período pré-operatório e como parte da avaliação geral ou dentro de até seis meses no pós-operatório na eventualidade de câncer obstrutivo.


TRATAMENTO

A cirurgia persiste como o pilar do tratamento do CR. Várias variáveis influenciam o tipo de operação a ser realizada, entre eles: condições gerais do paciente, idade, função esfinctérica, localização do tumor no reto, estadiamento, invasão de órgaõs vizinhos, qualidade do preparo intestinal e experiência do cirurgião.

O tratamento cirúrgico do CR pode ser curativo ou paliativo. O tratamento curativo é realizado com a intenção de se remover toda a lesão primária com margens de segurança bem como qualquer extensão de acometimento extra-retal seja ele sobre linfonodos ou órgãos vizinhos. O tratamento paliativo é oferecido quando a exérese completa do tumor primário não pode ser realizada quer seja por invasão não-negociável de órgãos vizinhos, más-condições do doente no momento da operação ou doença metastática.

Ao contrário do que se verifica para o adenocarcinoma do cólon, a recidiva local observada após tratamento cirúrgico curativo para o CR é alta e pode ser estimada grosseiramente em até 1/3 dos casos para os pacientes com CR invasivo. Dessa forma a cirurgia não mais desempenha papel isolado no tratamento do CR para a maioria dos casos. A recidiva local é um problema significativo na busca pela cura do CR.

Tipos de operações

As operações utilizadas no tratamento cirúrgico do CR são:

1. amputação abdominoperineal do reto (Miles);

2. retossigmoidectomia ou ressecção anterior do reto;

3. as operações de ressecção local por via transanal, por acesso trans-sacral (Kraske) ou inter-esfinctérico (York-Mason); e

4. as ressecções ampliadas

Pacientes com parentes de primeiro grau com câncer colorretal, deve ser submetido a colonoscopia.

Não deixe de consultar o seu médico.

Grande abraço,

Dr. Sérgio Barrichello